domingo, 27 de janeiro de 2008

Em relação ao mérito

Faço parte de um grupo muito especial de veteranos da FABICO. Somos os primeiros a ter bixos cotistas, e acho que já estava na hora de quebrar o silêncio e escrever sobre. É matemático que um assunto polêmico como esse levante opiniões radicais e sem embasamento, entre essas, muita coisa que não merecia nem ser ouvida. O problema é que grande parte dessas opiniões está vindo de onde não devia: da própria classe universitária, e, em especial e de modo muito preocupante, de alguns estudantes de comunicação social, pessoas que, na teoria, deveriam ser muito bem informadas.
Tendo em vista especialmente o resultado das cotas raciais em jornalismo, na UFRGS, é possível derrubar aquele tipo de argumento que dizia que qualquer um que concorresse como cotista seria aprovado sem nem precisar saber ler direito. Das oito vagas oferecidas para negros oriundos de escolas públicas, apenas duas foram ocupadas, provando que nenhum semi-analfabeto passa no vestibular da nossa federal – as vagas restantes permitiram a aprovação de mais seis alunos de escola pública sem distinção de etnia, além das oito já oferecidas. Há um bendito ponto de corte no vestibular, esquecido pelos que se colocam em oposição a esse sistema, que impede a aprovação de quem acerte menos que 67 das 225 questões de toda a prova objetiva, o que dá uma média de 7 acertos por prova (só para se ter uma idéia, a maioria das provas do vestibular da UFRGS de 2007 tinha média 9. Há uma diferença gigantesca no rendimento? É visível que não). Mas é preciso aprofundar-se na questão, e nesse caso os números não são necessários.
Falar em mérito pessoal numa sociedade extremamente desigual como a nossa é muito difícil e exige sensibilidade, coisa distante do senso-comum, que impera até mesmo numa universidade federal. É só pisar numa escola pública para se ver o estado deprimente dos ensinos fundamental e médio oferecidos. Digo isso por ter estudado minha vida toda em escola estadual. Para ilustrar, cito a carência, na minha antiga escola, de aulas eficientes de geografia, literatura e matemática só no terceiro ano, em que as professoras saíam no meio da aula para fumar e deixavam os alunos sem explicação nenhuma, e ai de quem perguntasse alguma coisa sobre a matéria! Agora, é justo, ou ao menos sensato, dizer que um aluno que sofre com falta de aulas tem menos mérito a uma vaga em alguma faculdade do que um aluno que estudou a vida inteira em escola privada, tendo o melhor ensino possível ao seu bolso? Meus colegas de ensino médio, por volta de trinta só na minha turma, nem falavam em prestar vestibular por se verem sem condições nenhuma de enfrentar qualquer um dos “bacanas” do Anchieta, do Leonardo da Vinci ou de tantas outras escolas privadas. Tendo-me como exemplo, que com um único ano de cursinho, pago a vinte prestações e com muita dificuldade, consegui desbancar muita gente que estudou toda a sua vida (!) em escola paga, pode-se ter uma base de quantas pessoas com as minhas mesmas capacidades são desperdiçadas por terem de trabalhar para ajudar a sustentar suas casas, perdendo qualquer oportunidade de entrarem no ensino superior em função de necessidades cotidianas.
Que mérito alguém tem por ter pago todos os seus As e Bs que qualquer um outro não teria se tivesse a mesma chance? É imperativo, para uma discussão sobre merecimento, que o ponto de partida para a comparação seja o mesmo para todos. O mesmo ensino, a mesma estrutura. Só a partir da igualdade é que podemos perceber quem merece mais do que quem. Apenas quando a todos forem dadas as mesmas oportunidades é que saberemos quem tem a bênção de poder entrar numa universidade. Pois, no final de tudo, essa discussão não passa da velha luta de classes. É tudo medo dessa gente, de perder um lugar sacramentado pela hierarquia social.
E, só para cutucar, mérito se prova mesmo dentro da faculdade, não numa prova objetiva que aprova apenas quem acerta mais. Os fabicanos que colam nas provas finais que o digam!

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Sexta-feira

Aí vai o texto produzido em LPI, Como pedido:

Sexta-feira

Sexta-feira, o tradicional “happy-hour”entre amigas com aquele chopp bem gelado, falando muitas besteiras, geralmente mal do trabalho, os melhores cabeleireiros, restaurantes, dietas, academias, plásticas. Quem seria o bonitão que apareceu no escritório da Jujuba era a pergunta que não queria calar. Risos, gargalhadas, uma mulherada efusiva demais para meu gosto. Eu, em meu canto, estava mais interessada em ver o fundo do meu caneco. O garçom desceu um, dois, três chopps, prometi a mim que pararia no próximo número primo.

Talvez a freqüência dos encontros tornaram-nos chatos, ou talvez tenha sido eu que tenha me tornada chata. Parece que o fenômeno da eterna juventude atingiu minhas amigas após suas separações. Todas querem aparentar serem adolescentes, com seus namorados da idade de seus filhos, usando as mesmas roupas que meninas de quinze anos usam, discutindo as Raves do momento, um “blablabla” horroroso, diarréia verbal. Nunca fui um poço de sabedoria, contudo nada de abusar. O mínimo de cultura e conhecimento prezara. Havia imaginado que ao chegar aos 40 anos não me sentiria assim tão deslocada, seria, sim, muito segura de mim, solteira convicta. Sempre. Chamar o garçom, jantar, e partir sozinha têm sido cada vez mais difícil. Começo me sentir sozinha ao lembrar que vou encontrar apenas meus scarpins em meu apartamento.

Sinto o álcool penetrando em cada célula do meu corpo, fazendo-me perder o controle de minhas ações – mais especificadamente dos meus olhares. Sem dar-me conta, “seco” o moreno de olhos verdes, ombros largos a duas mesas da minha. Sua eloqüência chamou-me muito a atenção, estava fascinada. O álcool e a falta de sexo há 43 dias me fizeram tomar uma decisão que sem esses agravantes nunca teria coragem: enviei um torpedo escrito em um guardanapo de seda através do garçom para o tal deus grego. Na hora, minhas amigas me olharam chocadas pela minha cara-de-pau. Segundo elas, o homem que tem que tomar a iniciativa, que eu havia manter a compostura – mas que compostura têm elas enfiadas em calças jeans dois números menores que o ideal? Apenas respondi “deu vontade, pronto”! O pior que poderia acontecer seria ser ignorada e voltar para casa descalça, pois não conseguia mais me equilibrar em meu salto agulha.

De súbito, o garçom se aproxima:

– Este é cortesia do rapaz da mesa ao lado – e serviu mais um chopp. O rapaz da mesa ao lado era o mesmo do torpedo. Olhei-o e ele respondeu com uma piscada. Corei na hora! Há tempos não flertara ninguém.

Senti-me o “gás da coca-cola”, todas aquelas “queridas” amigas babaram de inveja. No auge da bebedeira, percebi as meninas juntando suas bolsas e me abandonando ali, como se estivesse pegando fogo no bar. Até olho, na realidade tento olhar para os lados para ver o porquê da demanda, e o que vejo é o deus grego vindo rente a mim.

– Posso sentar-me aqui?

– Claro... (derretendo-me como uma manteiga).

Ao cumprimentá-lo com os tradicionais três beijinhos no rosto, percebo que ele também é incrivelmente cheiroso e transpassava uma segurança de quem sabe o que quer, e, naquele momento, era a mim que ele queria. Conseguia ler em seus olhos seus pensamentos mais pecaminosos – ou talvez seriam os meus pensamentos refletidos. Com aquele homem ao meu lado, senti-me a mulher mais poderosa do bar, da cidade, do universo! Estava podendo, fisguei o peixão da noite com um flerte pra lá de tosco.

A conversa fluía maravilhosamente bem, assim como as cervejas. Cada vez nossos corpos se aproximam mais, até que, ao pé do meu ouvido, acariciando meu pescoço, sugere:

– O que tu achas de conversarmos num lugar mais calmo, tenho ótimos vinhos e dvds em casa. O que mais lhe agrada?

– Merlot seco e Janis Joplin.

A resposta saiu sem pensar, puro impulso.

Juntei meus cacos não embriagados da cadeira e tentei acompanhá-lo com elegância. Sentindo minha dificuldade, ofereceu-me o braço. Meu Superego tentou pronunciar-se dizendo para não ir para a casa dele, entretanto o meu Ide berrava para que o acompanhasse. Não poderia ter outra atitude, talvez nunca mais o visse na vida, em outro momento nem percebesse minha existência. Aquela era a hora, o momento. Por conveniência, adotei o lema “Carpe Diem”. Só hoje não tem problema.

Ele abriu a porta do carro – o carro do bofe era de arrasar, como nunca entendi porcaria nenhuma de carros, o que posso dizer é que é daqueles importados que todos babam... sinceramente, eu moraria dentro dele.

Continuamos conversando durante o caminho, mas não conseguia abstrair mais nada da conversa, apenas imaginava aquele homem maravilhoso nu! E só pra mim! Mentalmente faço um check-up: depilação em dia, calcinha e sutiã combinando... é... tudo em ordem!

Chegamos ao apartamento: tudo muito lindo, muito bem decorado, impecável, um apartamento dos sonhos – não fazia idéia em que parte da cidade estava, mas nem fazia diferença mesmo! Enquanto ele escolhia o vinho, olhava os porta-retratos na tentativa de conhecer melhor o futuro pai dos meus filhos – sim, a essas alturas, um homem lindo, educado, com bom gosto e com uma vida feita é para casar! Começo a rir de mim mesma por pensar tal bobagem! Cueca na gaveta nunca, no máximo atirada no sofá!

Ele se aproxima com as taças de vinho. Serve a ambos e a tensão sexual tornou-se tanta, que não demorou muito para que nos beijássemos e os corpos tomassem o rumo do quarto. Apenas à luz de várias velas, fomos arrancando a roupa um do outro enlouquecidamente. As mãos não possuíam pudor algum, explorando cada centímetro de pele, sabor salgado na língua do suor do corpo. Várias vezes nossos olhos se encontravam e engoliam-se. Respirações cada vez mais ofegantes, palavras picantes sussurradas entre beijos. Era algo tão espontâneo que parecíamos amantes de longa data, e, no auge da excitação, falei:

– Vai, me agride!

Os olhos dele vibraram. Logo após ele ficou sério, até demais. Levanta-se da cama e busca tiras de cetim que estavam no criado mudo. Junta meus punhos, amarra-os e prende à parede que possuía uma argola de aço (dessas de pendurar redes) fixa.

Estava lá eu, nua e amarrada a parede. Forcei o nó – realmente estava presa.

– Esta noite serás minha. Minha propriedade, mas serás até quando tiveres vontade. Caso queira ser sua novamente, apenas diga “vermelho” ou faça um sinal “V” com os dedos.

Após isso se calou novamente. Essa coisa de sadismo apenas havia lido em Anais Nin e nos contos do Marquês de Sade! Na curiosidade, resolvi aceitar para conferir qual era o “barato”.

Retira do seu criado mudo também, na segunda gaveta, duas algemas que prendem meus tornozelos às pernas da cama. Gelo no estômago. Estava inerte aos caprichos dele, mas empolgada, e muito curiosa.

Em minha boca põe uma fita tape, nem que me esgoelasse não conseguiria gritar. Começa a dar tapas cada vez mais fortes em minhas nádegas. As mãos tornaram-se garras. Ao invés de beijar meus mamilos, mordidas fortes. Mais tapas pelo corpo. Parei e olhei para situação em que me encontrava. Estava na casa em que mais parecia uma masmorra e me submetendo a boneca inflável.

Ficou ali observando-me, como se agora eu fosse o troféu da noite. Não pronuncia uma palavra, quando me toca, não é carícia como antes, sim agressão.

Quando ele puxa um chicote de três tiras, tento gritar desesperadamente a merda da palavra “vermelho”, mas a fita não permite! Ele chicoteia a cama, pega de raspão no meu tornozelo – vejo que corta minha pele branca. Desesperadamente faço a porra do sinal “V” com os dedos e a chorar enlouquecidamente. Ele dá um pulo da cama e pergunta se quero parar. Confirmo que sim com a cabeça.

– Ok, vou lhe soltar, mas me promete uma coisa?

Respondo que sim com a cabeça.

– Promete que não vais sair correndo quando te soltar?

Novamente respondo que sim.

Tira-se a fita de minha boca, assim mostrando que já estava soluçando como uma criança quando está chorando de medo. Abre-se as algemas dos tornozelos e, com muita calma, ele desamarra meus punhos. Dou um pulo para o canto da cama. Com o susto, todo álcool se fora embora do meu organismo. Enrolo-me no lençol e me afasto para o outro canto do quarto. Ele se aproxima e começo a gritar, chorar. Chamo-o de louco, pervertido. Não dou nenhuma chance para o doido se explicar ou ao menos dar desculpas. Corro para o banheiro com minhas roupas. Me vesti tão rápido que coloquei o vestido do avesso. Saio com uma cara de super desconfiada e peço para que me deixe num ponto de táxi. Ele insiste para que me leve até em casa, como um pedido de desculpas.

Aceitei a carona para casa, não fora citada uma palavra sequer o caminho inteiro. Ao descer do caro, ele solta um “desculpe qualquer coisa”.

Deu vontade de mandar a merda um otário desses. Ninguém o avisou que não se sai chicoteando as pessoas por aí? Fico quieta e dou as costas.

Entro em casa, tomo um bom banho para relaxar. Deito-me. Minha adrenalina ainda estava alta, não conseguia dormir.Tomei três lexotans e uma séria decisão: Amanhã compro um vibrador. Dá menos dor de cabeça e quem manda nessa relação de posse sou eu!